sábado, 10 de agosto de 2013

CRÔNICAS

Os Bravos Leões do Agreste

Zé Afonso permanecia em pé na única porta da tosca habitação em que morava com a família. Era um homem diferente de todos que conheci. Tinha algo que causava naqueles que o vissem, impressão tão forte que jamais seria esquecido. Pernas compridas e arqueadas; braços longos terminados por enormes mãos deformadas por grosseiros calos que mal comparando, lembram as escamas do pirarucu. Ossos quase a mostra, eram cobertos por frágil musculatura revestida por pele áspera e enrugada. No rosto do sertanejo estava escrita toda sua vida: miséria, fome, desprezo e dor poderiam ser vistos em cada ruga que deformavam seu semblante. Os olhos sem brilho mostravam a têmpera do homem do agreste, eram frios e ariscos.

Olhei pra Zé Afonso bem dentro dos seus olhos. Ele me encarou um tanto encabulado, mas me encarou. Por mais que me esforçasse, não conseguira notar naquele brasileiro sofrido, quaisquer vestígios de ódio ou rancor. Do pescoço pendia um rústico cordão tecido com fios de juta e algodão onde se destacava uma pequena cruz de madeira feita por ele mesmo que continha a inscrição "Gezus Sarva", entalhada pelo caboclo com um canivete. 

Aproximei-me de Zé Afonso e ao seu lado contemplei o deprimente cenário que envolvia sua tosca habitação. Nada vi que prendesse alguém àquele lugar. No chão, rachaduras enormes passavam-me a impressão que ali houvera um terremoto. A terra totalmente calcinada mostrava que não chovia naquela região há alguns anos. Vegetação, nem sombra. Verifiquei entristecido um emaranhado de árvores retorcidas e acanhadas em forma de garranchos, ocupando toda aquela área e estendendo-se até onde meus olhos não mais alcançavam. Até o xiquexique, espécie de cactos do agreste, estava semimorto. Vida animal nem pensar. Até urubus não eram vistos por ali. 

Olhei atentamente as fendas do solo na esperança de encontrar algum inseto ou larva, nada vi. Perguntei a Zé Afonso pelo restante de sua família ele, depois de acender o pito que é um cachimbo artesanal moldado em barro e com um talo de bambu servindo para aspirar à fumaça dos fragmentos incandescentes de fumo colocados no seu interior, franziu a testa e respondeu: - "Home rapaz, a muié e as criança sairo p'ra prucurá arguma coisa p'ra cume e inda num vortaro. Já to ficando inquieto!"

Reparando a aflição do sertanejo, propus-lhe que ambos fôssemos procurá-los. O homem, esboçando um sorriso, entrou rapidamente em um dos cômodos do casebre, saindo logo após colocar em volta da cintura um verdadeiro cinto de utilidades idealizado por ele e confeccionado com couro cru no qual, dentre outras bugigangas, pendiam um velho facão cheio de dentes e uma sacola onde colocou um punhado de pedrinhas. Perguntei-lhe para que se destinavam e ele sem nada dizer, enfiou a mão na

Matula, espécie de mochila e, após abri-la, retirou um estilingue preparado com tiras de borracha e uma forquilha. Saímos pela terra poeirenta indo Zé Afonso à frente. Ele bramia vigorosamente o facão que zunia em suas mãos cortando os galhos repletos de espinhos que ora ou outra impediam nossa caminhada. Após andarmos por um tempo não cronometrado, verifiquei atordoada a imensidão desértica que separava Zé Afonso da civilização menos sofrida. A paisagem era aterradora. Ao lado do caminho, ossos de animais de vários portes abatidos pela seca implacável testificavam o descaso com que é tratada aquela região. O Sol escaldante dava-nos a sensação térmica de marcharmos no interior de uma fornalha. O suor escorrendo pela minha testa atingia meus olhos e dificultando uma melhor visualização daquele cenário deprimente. Sorte minha!... Poeira, calor infernal e um profundo silêncio eram a nossa companhia. No céu de um azul imaculado, nem uma nuvem sequer. A calmaria me incomodava. Notava-se que nem o vento se atrevia a penetrar ali. Até ele sentia medo.

De repente, Zé Afonso parou, colocou as mãos em forma de concha em um dos ouvidos e sorriu. O primeiro sorriso que vi em seus lábios, deixando à mostra os últimos dentes; três somente três. O semblante do caboclo tornou-se menos tenso. Fiquei atônito, pois nada percebi. Meu companheiro de jornada ainda sorridente disse-me que sua família se aproximava. Sentamo-nos em uma laje de pedra à sombra de outra de maior envergadura e começamos a ouvir o alarido de crianças que cada vez tornava-se mais intenso. Finalmente, apareceram uma mulher magérrima, pele e ossos, seguidos por uma legião de seres pequeninos e desnutridos. Era quatorze ao todo. Meninos e meninas com idades e estaturas diferentes. Pálidos, esqueléticos e com olhares tão tristes que jamais poderão ser esquecidos. O céu e a terra passarão, mas aquelas fisionomias jamais haverão de se apagar na minha memória. Tentei conter as lágrimas e não pude.

Sentimentos confundiram-se no meu coração: medo, vergonha, ódio, vontade de fazer alguma coisa e sentindo-me impotente, além da de descrença na misericórdia de Deus. Tudo isso se misturou dentro de mim e gritei. Entre soluços gritei e minha voz ecoou ao longe como o uivo de um animal ferido: - Deus!... Por quê?... Porque Senhor?... Porque abandonastes a essas pessoas?... Todos me olharam assustados. Surpresos e sem entenderem minha reação intempestiva que logo foi esquecida.

O sertanejo apresentou-me sua companheira, Maria de Nazaré era seu nome. Ela, olhando-me encabulada, estendeu-me a mão grosseira e esquelética. Ao apertá-la em cumprimento, senti-lhe os ossos e calos. - "Este seu moço, é o Juquinha. Aqueles são o Severino, João Pequeno, Zé Minino, Ritinha, etc e etc." Quando fui apresentado ao caçula, confesso que já havia esquecido os outros nomes, tal a quantidade. Perguntei a Zé Afonso porque ele não abandonava aquele inferno e migrava para qualquer cidade grande. O homem, com um aceno de cabeça disse não, explicando-me que em razão de ser analfabeto e ter uma família numerosa, seria mais um mendigo a perambular pelas ruas com sua numerosa prole. Concordei.


Autor: Walmir Ferreira dos Santos




A ARMADILHA DO TWITTER 

Semana passada minha mulher e eu autorizamos nossa filha de 13 anos a entrar no Facebook. Em algumas horas ela acumulou 171 amigos e eu me senti um pouco como se tivesse dado à minha filha um cachimbo com ópio. Não pretendo ser um estraga-prazeres. Edito um jornal que abraçou a nova mídia com entusiasmo e criatividade. Entendo que a internet alcança e mobiliza uma audiência global, que ela convida à participação e facilita – até certo ponto – a apuração de notícias. Mas, antes de nos rendermos à idolatria digital, devemos ponderar que a inovação sempre tem um preço. Às vezes imagino se ele não é um pedaço de nós mesmos. 

O cativante best-seller “Moonwalking with Einstein”, de Joshua Foer, cita um colossal exemplo do que nós trocamos pelo progresso. Até o século XV, as pessoas eram ensinadas a guardar uma vasta quantidade de informações. Façanhas da memória – como recitar de cor livros inteiros – não eram raras. Então surgiu o Mark Zuckerberg de sua época, Johannes Gutenberg. À medida que nos acostumamos a depender da página impressa, o hábito de guardar de cor caiu gradualmente em desuso. A capacidade prodigiosa de se lembrar ainda existe, mas, para a maioria, está na garagem. 

Meu pai, que estudou engenharia no MIT na época da régua de cálculo, lamentava que a calculadora de bolso, com todas as suas conveniências, reduziram a capacidade matemática de minha geração. Muitos de nós descobrimos que a navegação por GPS comprometeu nosso conhecimento sobre as ruas da cidade e talvez tenha até prejudicado nosso senso inato de direção. 

Bater à máquina matou o ato de escrever à mão. Twitter e Youtube estão tirando nacos de nossa atenção. E o pouco de nossa memória que não entregamos a Gutenberg abdicou em favor do Google. Por que lembrar se achamos em segundos? 

Robert Bjork, que estuda memória e aprendizado na UCLA, notou que mesmo estudantes muito inteligentes, familiarizados com o Excel, não são capazes de perceber nos dados padrões que seriam evidentes se não tivessem deixado o programa fazer a maior parte do trabalho. Foer leu que a Apple contratara um grande especialista em mostradores monitorizados – os painéis transparentes usados por pilotos. Ele se pergunta se isto significa que a Apple esteja desenvolvendo um iphone que dispensaria usar os dedos no teclado. O comando viria diretamente do córtex cerebral (a Apple não quis comentar). Estamos terceirizando nosso cérebro para a nuvem. O lado positivo é que isto libera massa cinzenta para coisas importantes. Mas meu pessimismo imagina se as novas tecnologias não estariam erodindo características essencialmente humanas: a capacidade de refletir, a busca por significado, a empatia genuína, um senso de comunidade conectado por algo mais profundo. 

A mais óbvia desvantagem das mídias sociais é que elas são agressivamente detrativas. O Twitter não é uma mera presença no ambiente. Ele exige atenção e resposta – é o inimigo da contemplação e do aprofundamento. Cada vez que o notificador apresenta na minha tela um novo tweet, eu experimento um pequeno surto de dopamina que me distrai imediatamente daquilo que eu estava fazendo, mas… mas… o que era mesmo que eu estava fazendo? Minha desconfiança em relação à mídia social é intensificada pela natureza efêmera dessas comunicações. 

Não estou nem mesmo seguro de que esses novos instrumentos sejam genuinamente “sociais”. Há algo decididamente falso sobre a camaradagem no Facebook, algo ilusório sobre conectividade do Twitter. Espreite uma conversa na multidão digital e, muito freqüentemente, ela é reduzida e redundante. Como uma espécie de experiência masoquista, outro dia tuitei “#Twittertorna você burro. Discuta.” Isso produziu poucos flashes de inteligência (“Dê algum crédito a nossas escolas públicas!”); um par de respostas óbvias (“Depende de quem você segue”); algumas especulações compreensíveis de que minha conta tinha sido hackeada; e um monte de gírias. Quase todo mundo que não tinha algo profundo a dizer em resposta à minha pequena provocação preferiu fazê-lo fora do Twitter. 

Numa discussão real, a informação é cumulativa, a complicação é reconhecida, às vezes a persuasão ocorre. Numa discussão no Twitter, opiniões e nossa tolerância às opiniões alheias são atrofiadas. Não sei se o Twitter torna você burro, mas ele faz algumas pessoas inteligentes parecerem burras. Percebo que estou atraindo fogo de tuiteiros apaixonados, de acadêmicos que adoram idolatrar novidades e de colegas do “New York Times” que estão criando uma estratégia para a mídia social com o objetivo de ampliar o alcance de nosso jornalismo. Então me deixe esclarecer: o Twitter é um recurso brilhante – um megafone para promoção, uma rede para a informação, uma valiosa ferramenta para organizar tudo, de encontros de donos de cães a revoluções. Embora eu não seja muito tuiteiro e preste pouca atenção à minha conta no Facebook, gosto de ver algo que escrevi cair na Twittersphere, mesmo quando sei – como agora – que o veredito da massa será hostil. 

As desvantagens da mídia social não me incomodariam terrivelmente se eu não suspeitasse que a Amizade do Facebook e a conversa no Twitter estão tomando o lugar da relação e da conversação reais. As coisas que podemos estar deixando de aprender complexidade, acuidade, paciência, sabedoria, intimidade – fazem diferença. 



Autor: Bill Keller é Jornalista 

©The New York Times 
Enviado por: Arthur Morais 
Site: http://www.velhosamigos.com.br 





O SEGREDO DO XIXI EM GRUPO 

Só uma mulher consegue entender cada vírgula deste texto, mas os homens têm que ler para saber compreendê-las! Quando você TEM que ir ao banheiro público, você encontra uma fila de mulheres, que faz você pensarem que o Bradd Pitt deve estar lá dentro. Você se resigna e espera, sorrindo para as outras mulheres que também estão com braços e pernas cruzados na posição oficial de "estou me mijando”. Finalmente chega a sua vez, isso, se não entrar a típica mamãe com a menina que não pode mais se segurar. 

Você, então verifica cada cubículo por debaixo da porta para ver se há pernas. Todos estão ocupados. Finalmente, um se abre e você se lança em sua direção quase puxando a pessoa que está saindo. Você entra e percebe que o trinco não funciona (nunca funciona); não importa... Você pendura a bolsa no gancho que há na porta e se não há gancho (quase nunca há gancho), você inspeciona a área. o chão está cheio de líquidos não identificados e você não se atreve a deixar a bolsa ali, então você a pendura no pescoço enquanto observa como ela balança sob o teu corpo, sem contar que você é quase decapitada pela alça porque a bolsa está cheia de bugigangas que você foi enfiando lá dentro, a maioria das quais você não usa, mas que você guarda porque nunca se sabe...Mas, voltando à porta...Como não tinha trinco, a única opção é segurá-la com uma mão, enquanto, com a outra, abaixa a calcinha com um puxão e se coloca "na posição". Alívio... Aahhhhhh.....finalmente... 

Aí é quando os teus músculos começam a tremer [...] Porque você está suspensa no ar, com as pernas flexionadas e a calcinha cortando a circulação das pernas, o braço fazendo força contra a porta e uma bolsa de 5 kg pendurada no pescoço.Você adoraria sentar, mas não teve tempo de limpar o assento nem de cobrir o vaso com papel higiênico. No fundo, você acredita que nada vai acontecer, mas a voz de tua mãe ecoa na tua cabeça "jamais sente em um banheiro público!" e, assim, você mantém "a posição" com o tremor nas pernas...E, por um erro de cálculo na distância, um jato finíssimo salpica na tua própria bunda e molha até tuas meias!! Por sorte, não molha os sapatos. Adotar "a posição" requer grande concentração. Para tirar essa desgraça da cabeça, você procura o rolo de papel higiênico, maaassss, para variar, o rolo está vazio...! Então você pede aos céus para que, nos 5 kg de bugigangas que você carrega na bolsa, haja pelo menos um miserável lenço de papel. Mas, para procurar na bolsa, você tem que soltar a porta. Você pensa por um momento, mas não há opção... 

E, assim que você solta a porta, alguém a empurra e você tem que freá-la com um movimento rápido e brusco enquanto grita OCUPAAADOOOO!!! 

Aí, você considera que todas as mulheres esperando lá fora ouviram o recado e você pode soltar a porta sem medo, pois ninguém tentará abri-la novamente (nisso, nós, as mulheres, nos respeitamos muito) e você pode procurar seu lenço sem angústia. Você gostaria de usar todos, mas quão valiosos são em casos similares e você guarda um, por via das dúvidas. Você então começa a contar os segundos que faltam para você sair dali, suando porque você está vestindo o casaco já que não há gancho na porta ou cabide para pendurá-lo. É incrível o calor que faz nestes lugares tão pequenos e nessa posição de força que parece que as coxas e panturrilhas vão explodir. Sem falar do soco que você levou da porta, a dor na nuca pela alça da bolsa, o suor que corre da testa, as pernas salpicadas... A lembrança de sua mãe, que estaria morrendo de vergonha se a visse assim, porque sua bunda nunca tocou o vaso de um banheiro público, porque, francamente, "você não sabe que doenças você pode pegar ali" 

[...] você está exausta. Ao ficar de pé você não sente mais as pernas. Você acomoda a roupa rapidíssima e tira a alça da bolsa por cima da cabeça! Você, então, vai à pia lavar as mãos. Está tudo cheio de água, então você não pode soltar a bolsa nem por um segundo. Você a pendura em um ombro, e não sabendo como funciona a torneira automática, você a toca até que consegue fazer sair um filete de água fresca e estende a mão em busca de sabão. Você se lava na posição de corcunda de notre dame para não deixar a bolsa escorregar para baixo do filete de água... O secador, você nem usa. É um traste inútil, então você seca as mãos na roupa porque nem pensar usar o último lenço de papel que sobrou na bolsa para isso. 

Você então sai. Sorte se um pedaço de papel higiênico não tiver grudado no sapato e você sair arrastando-o, ou pior, a saia levantada, presa na meia-calça, que você teve que levantar à velocidade da luz, deixando tudo à mostra! 

Nesse momento, você vê o seu amigo que entrou e saiu do banheiro masculino e ainda teve tempo de sobra para ler um livro enquanto esperava por você. "Por que você demorou tanto?" Pergunta o idiota. Você se limita a responder: "A fila estava enorme". 

E esta é a razão porque nós, as mulheres vão ao banheiro em grupo. Por solidariedade, já que uma segura a tua bolsa e o casaco, a outra segura a porta e assim fica muito mais simples e rápido já que você só tem que se concentrar em manter "a posição" e a dignidade. 

Obrigada a todas as amigas que já me acompanharam ao banheiro. 


Autora: Ana Cristina de Sá 










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